Texto de Joanna de Ângelis, do livro "Amor, Imbatível Amor" - psicografado por Divaldo Franco.
Tem sido estabelecido através da
cultura dos tempos, que a infância é o período mais feliz da existência humana,
exatamente pela falta de discernimento da criança, e em razão das suas
aspirações que não passam de desejos do desconhecido, de necessidades imediatas,
de ignorância da realidade.
Os seus divertimentos são legítimos,
porque a eles se entrega em totalidade, sem qualquer esforço, graças à
imaginação criadora que a transporta para esse mundo subjacente do crer naquilo
que lhe parece. Não estando a personalidade ainda formada, não há dissociação
entre o que tem existência real e aquilo que somente se fundamenta na
experiência mental.
A criança atravessa esse período
psicologicamente feliz, sem o saber, com as exceções compreensíveis de casos
especiais, porque tampouco sabe o que é a felicidade. Só mais tarde, na idade
adulta é que, recordando os anos infantis, constata o seu valor e pode ter
dimensão dos acontecimentos e prazeres.
Como a criança não sabe o que é
felicidade, facilmente identifica-a no divertimento, aquilo que a agrada e a
distrai, os jogos que lhe povoam a imaginação.
É na infância que se
fixam em profundidade os acontecimentos, aliás, desde antes, na vida
intrauterina, quando o ser faz-se participante do futuro grupo familiar no qual
renascerá. As impressões de aceitação como de rejeição se lhe esculpirão em
profundidade, abençoando-o com o amor e a segurança ou dilacerando-lhe o
sistema emocional, que passará a sofrer os efeitos inconscientes da animosidade
de que foi objeto.
Da mesma forma, os acontecimentos à sua
volta, direcionados ou não à sua pessoa, exercerão preponderante influência na
formação da sua personalidade, tornando-a jovial, extrovertida ou conflitada,
depressiva, insegura, em razão do ambiente que lhe plasmou o comportamento.
Essas marcas acompanhá-la-ão até a
idade adulta, definindo-lhe a maneira de viver. Tornam-se feridas, quando de
natureza perturbadora, que mesmo ao serem cicatrizadas, deixam sinais que
somente uma terapia muito cuidadosa consegue anular.
Por sua vez, o Espírito, em processo de
reencarnação, acompanha mui facilmente os lances que precedem à futura
experiência, e porque podendo movimentar-se com relativa liberdade antes do
mergulho total no arquipélago celular, compreende as dificuldades que terá de
enfrentar mais tarde, ao sentir-se desde então indesejado, maltratado,
combatido.
Certamente, essa ocorrência tem lugar
com aqueles que se vêm impelidos ao renascimento para reparar pesados
compromissos infelizes, retornando ao seio das suas anteriores vítimas que
agora os rechaçam, o que é injustificável.
A bênção de um filho constitui
significativa conquista do ser humano, que se deve utilizar do ensejo para
crescer e desenvolver os sentimentos superiores da abnegação e do amor.
As reações
vibratórias que podem produzir os Espíritos antipáticos na fase perinatal,
produzem, não raro, mal-estar. Não obstante, a ternura e a cordialidade
fraternal substituem as ondas perturbadoras por outras de natureza saudável,
preparando os futuros pais para o processo de aprimoramento e de educação do
descendente.
Na raiz de muitos conflitos e
desequilíbrios juvenis, adultos, e até mesmo ressumando na velhice, as
distonias tiveram origem — efeito de causa transata — no período da gestação,
posteriormente na infância, quando a figura da mãe dominadora e castradora, assim
como do pai negligente, indiferente ou violento, frustrou os anseios de
liberdade e de felicidade do ser.
Todos nascem para ser livres e felizes.
No entanto, pessoas emocionalmente enfermas, ante o próprio fracasso,
transferem para os filhos aquilo que gostariam de conseguir, suas culpas e
incapacidades, quando não descarregam todo o insucesso ou insegurança naqueles
que vivem sob sua dependência.
Esse infeliz recurso fere o cerne da
criança, que se faz pusilânime, a fim de sobreviver ou leva-a a refugiar-se no
ensimesmamento, na melancolia, sentindo-se vazia de afeto e objetivo de vida.
Com o tempo, essas feridas pululam, impelindo a atitudes exóticas, a
comportamentos instáveis, às fugas para o fumo, a droga, o álcool ou as
diversões violentas, mediante as quais extravasam o ressentimento acumulado, ou
mergulham no anestésico perigoso da depressão com altos reflexos na conduta
sexual, incompleta, insatisfeita, alienadora...
A sociedade terá que
atender à infância através de mecanismos próprios, preenchendo os espaços deixados
pela ausência do amor na família, na educação escolar, na convivência do grupo,
nas oportunidades de desenvolvimento e de autoafirmação de cada qual. Para tal
mister, torna-se necessário o equilíbrio do adulto, do educador formal, que
pode funcionar como psicoterapeuta, orientando melhor o aprendiz e
reencaminhando-o para a compreensão dos valores existenciais e das finalidades
da vida.
Inveja, mágoa, ciúme, instabilidade,
ódio, pusilanimidade e outros hediondos sentimentos que afligem as crianças
maltratadas, carentes, abandonadas mesmo nas casas onde moram, desde que não
são lares verdadeiros, constituem os mecanismos de reação de todos quantos se
sentem infelizes, mesmo que inconscientemente.
A compreensão dos direitos alheios e
dos próprios deveres, o contributo da fraternidade, a segurança afetiva, a
harmonia interior, a compaixão, a lealdade se instalarão no ser, cicatrizando
as feridas, à medida que o meio ambiente se transforme para melhor e o afeto
dos outros, sincero quão desinteressado, substitua a indiferença habitual.
Qualquer ferida emocional cicatrizada
pode reabrir-se de um para outro momento, porquanto não erradicada a causa
desencadeadora, os tecidos psicológicos estarão muito frágeis, rompendo-se com
facilidade, pela falta de resistência aos impactos enfrentados.
A questão da felicidade, por isso
mesmo, é muito relativa. Se a felicidade são os divertimentos, ou é o prazer,
ei-la de fácil aquisição. No entanto, se está radicada na plenitude, muito
complexa é a engrenagem que a aciona.
De certo modo, ela
somente se expressa em totalidade, quando o artista conclui a obra a que se
entrega, o santo ao ministério de amor a que se devota, o cientista realiza a
pesquisa exitosa, o pensador atinge com a sua mensagem o mundo que o aguarda, o
cidadão comum se sente em paz consigo mesmo... O dar-se, a que se refere o
Evangelho, certamente é a melhor metodologia para alcançar-se essa ventura que
harmoniza e plenifica.
Toda vez, portanto, que alguém sinta
incompletude, insegurança, seja visitado pelos sentimentos inquietadores da
insegurança, do medo, da raiva e da inveja injustificáveis, exceção feita aos
estados patológicos profundos, as feridas da infância estão ainda abertas ou
reabrindo-se, e necessitando com urgência de cicatrização.
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