texto do livro "Conectando Ciência, Saúde e Espiritualidade V.1 - AMERGS - Michelle P.Santos)
A
adolescência, definida como o período que se estende entre a infância e a idade
adulta, possui como preâmbulo de seu desenvolvimento a puberdade, marcada pelas
alterações corpóreas, seguida de novas necessidades psicossociais. Se do latim
“adultus” refere-se àquele que parou de crescer, “adolescer” significa crescer,
estar em crescimento.
A Doutrina Espírita, nos
brindando com estudos que ampliam nosso conhecimento acerca das relações
Espírito-matéria, nos oferece ocasião de aprofundarmos nossa visão sobre as
minúcias características desta fase do desenvolvimento humano. O Espírito
renascido, agora de posse de sua nova identidade no mundo, enfrenta novos
desafios de sublimação de si mesmo.
Do
ponto de vista físico, observamos a aceleração do crescimento esquelético, com ampliação
de peso e altura, e aumento dos hormônios sexuais, o que influencia o
funcionamento do Sistema Nervoso Central, interferindo no humor e no
comportamento. Há o desenvolvimento das características sexuais primárias
(órgãos reprodutores e genitália externa) e secundárias (desenvolvimento dos
seios e alargamento dos quadris, nas mulheres, e crescimento de pelos faciais e
mudança na voz, nos homens).[1]
A
menstruação (ou menarca) se faz presente, podendo ser sentida como uma
afirmação da feminilidade nas meninas, ou acompanhada de receios pela falta de
informação. Podem retardar seu aparecimento o estresse, fraco estado
nutricional ou exercícios excessivos. Do mesmo modo surge a ejaculação de
espermatozoides nos meninos.
Psicologicamente
nota-se uma aceleração do desenvolvimento cognitivo com consequente progresso
da atividade mental, que prepara o indivíduo para novas relações sociais que o
disponibilizarão à fase seguinte da adultez jovem. Segundo as teorias de Jean
Piaget[2], trata-se do estágio das
operações formais: o pensamento se torna abstrato, conceitual e orientado para
o futuro evidenciando notável criatividade (artes, música, poesia, esportes,
ideias).
É
comum a presença da masturbação, antecedendo as primeiras experiências de
contato sexual com outro indivíduo, e também se fazem corriqueiras as
experiências homossexuais transitórias. Rituais de iniciação são observados em diversas
épocas, e na nossa cultura atual podemos verificar desde a primeira comunhão
dos católicos, os bar e bat-mitzvah dos judeus e os trotes aos calouros nas
universidades, até os piercings e tatuagens que identificam os jovens como
membros de seus grupos de pares.
A
intensidade das transformações, acrescida pelo luto pela identidade infantil e
a inoperância dos velhos padrões de funcionamento, tornam o indivíduo estranho
a si mesmo e ativam um processo arquetípico que o leva a revisar suas posições
existenciais. As relações familiares são marcadas por ambivalência: a
necessidade de se tornar independente e o desejo de se manter recebendo
proteção, apoio e carinho. É comum a presença de instabilidade de humor,
sensibilidade e questionamento de valores existentes, espelhando necessidades
de renovação e mudança temperadas pelas próprias vivências internas.[3]
A adolescência é, ainda, a fase
em que está completa a reencarnação[4]. Da infância, onde se
apresentava uma não-consciência de seus atos acrescida da inocência, agora o
espírito apresenta suas verdadeiras tendências, de forma que cabe a si a
responsabilidade sobre o aprendizado absorvido na condição de criança.
Tendo
vivido a oportunidade de se adaptar às novas condições de vida, à família, aos
costumes, agora a tarefa é preparar-se para cometimentos mais profundos
relacionados à experiência com o trabalho e a vida em sociedade. Assim, as
crises de identidade também são potencializadas pelo choque entre a
individualidade espiritual e a personalidade atual.
Segundo
Joanna de Angelis[5], o adolescente, tratando-se de
espírito viajor de longas jornadas, traz débitos dos quais muitas vezes não se
desincumbiu conforme o esperado, propondo-se agora ao ressarcimento. Neste
sentido se faz mister a educação. A libertação dos vícios anteriores e a
aquisição de novos valores que os contrabalancem, superando-os, é a tarefa
espiritual desta etapa. Amor, conhecimento e disciplina: eis as ferramentas que
lhes insculpirão no ser as lições que os acompanharão para sempre.
Sexualidade
Manifestação
da necessidade de intercâmbio afetivo entre os seres, a sexualidade trata-se de
fenômeno mais complexo do que a simples continuação da espécie. Sincronia no
vegetal, instinto no animal, embrião de novas conquistas evolutivas do futuro
no hominal, na adolescência a sexualidade aflora mais intensamente manifestando
possíveis perturbações do passado e ansiando por sua expressão em forma
superior quando a serviço do amor.
A
libido, sob seus impulsos (do amor), como força criadora, não produz tormento,
não exige satisfação imediata, irradiando-se, também, como vibração envolvente,
imaterial, profundamente psíquica e emocional. Quando o sexo se impõe sem o
amor, a sua passagem é rápida, frustrante, insaciável...
André
Luiz[7] nos informa quanto à importância
da epífise, cuja função não se restringe ao controle dos instintos sexuais
durante a infância para depois se tornar órgão morto. A tão estudada glândula
pineal segrega hormônios psíquicos ou “unidades-força” que controlam os
sistemas sexual e endócrino, acordando, no período em questão, as forças
criadoras da psique. Há, assim, uma recapitulação da sexualidade na
adolescência, de modo que as paixões vividas noutras existências reaparecem
como fortes impulsos.
No processo de educação do ser
que se reinicia na experiência física é fundamental abarcar o sentido profundo
do sexo, não se limitando ao conhecimento do corpo físico e suas funções.
Conflitos, medos, anseios, harmonia imprimem matrizes emocionais, limitações
orgânicas, exaltação ou deficiências na libido e possíveis preferências
perturbadoras que necessitam de orientação.
A
função educadora é dos pais. Transferi-la a terceiros, ou mesmo à escola, é
correr o risco do assunto ser abordado com irresponsabilidade. Fundamental se
torna que as próprias figuras parentais busquem conhecimento, se beneficiem de
terapêutica especializada, para que, seguros e sem repetir modelos castradores
do passado, ou libertinos, tão em voga em nossa sociedade atual, possam se constituir
em exemplos dignos de serem seguidos. Educar com alegria e naturalidade, sem
excesso ou ausência de pudor e evitando informações para as quais não haja
interesse do educando, é rota segura para desenvolvimento de harmonia na área
da sexualidade.
Diante
da gravidez na adolescência, se faz imprescindível ao jovem assumir a
responsabilidade com relação ao ser que renasce, pois se há maturidade para o
ato sexual, há – ou deverá construir-se – a mesma para a maternidade e
paternidade[8], através da consciência do
dever. O aborto, que constitui grave trauma psicológico de consequências
imprevisíveis, deve ser evitado, a não ser diante de risco de vida para a mãe.
Ele não apaga erros cometidos por imprevidência, apenas dá lugar ao infanticídio[9], gerando novas necessidades de
reparação.
Assim,
para compreender a sexualidade de modo mais amplo, não podemos desconsiderar a
anterioridade da alma. Suas expressões variadas, atestando a bissexualidade
psicológica do ser, com ou sem distúrbios, atestam a longa caminhada do
Espírito e não podem ser julgadas de modo sensacionalista ou preconceituoso.
Segundo
a nobre mentora citada, qualquer força deixada em desequilíbrio, danifica e
destroi. E a sexualidade tem conduzido a História da humanidade, de modo que
hecatombes morais, sociais e espirituais, além de desastres bélicos, têm
relação com líderes doentios que não conseguiram dominar essa energia que os
alucinava.
Examine-se
qualquer déspota, e nele encontrarão registros de distúrbios na área do
comportamento sexual. (Joanna de Angelis)[10]
O
sexo existe a serviço da vida, não a vida a serviço do sexo. Sofrendo a
influência dos automatismos criados pela permanência nos instintos inferiores
no decorrer da escalada evolutiva, cabe à razão a canalização dos últimos em
prol da iluminação do ser. E ao Amor, cabe sempre mostrar a diretriz para
cometimentos felizes.
Vícios
Sensações
já consolidadas, ligadas ao prazer ilusório do entorpecimento, muitas vezes
como fuga dos conflitos emocionais subjacentes, podem reacender-se em momentos
cruciais como a adolescência. Isto
porque é característica do período a vivência de inúmeros conflitos, e os
viciados renitentes são vítimas do mesmo hábito que mantiveram em existência
anterior.
Segundo
André Luiz[11] as drogas psicoativas, ao
adentrarem o organismo físico, atingem os neurônios e também seus correlatos
perispirituais. Considerando que o perispírito atua como um filtro dosador na
adaptação das energias espirituais ao corpo físico e vice versa, pode-se compreender
a possibilidade de um bloqueio de energia que gera desequilíbrio espiritual –
não somente físico. Acrescentamos a isto a vinculação com entidades
desencarnadas em desalinho que vêm somar desajustes emocionais e enfermidades
várias e não é difícil concluirmos que o vício, de qualquer natureza, conduz à
infelicidade.[12]
Fuga
da realidade, conflitos sexuais ou emocionais em geral (timidez, complexo de
inferioridade, transtornos masoquistas, ciúmes), maus exemplos de cuidadores
incapazes de suportar as próprias frustrações, agressões domésticas, falta de
carinho, pressões sociais de amigos perturbados ou traficantes insensíveis às
necessidades do outro são fatores relacionados ao uso de drogas na
adolescência. As drogas são muitas vezes buscadas inconscientemente como
“tratamento”: para trazer coragem diante de determinada situação; calma, diante
de outras.
No entanto, o que se consegue é
uma agravação dos conflitos psicológicos subjacentes, senão o desencadeamento
de doença mental. Assim, os pais devem ter discernimento para perceberem quando
o filho precisa de ajuda especializada. E o jovem, para poder buscar essa
superação com a ajuda de profissionais capacitados e não de traficantes.
A curiosidade pode ser
acrescentada como outro elemento, entendida por Joanna de Angelis[13], neste caso, como mais uma manifestação
de desequilíbrio: como se para conhecer a gravidade de uma doença fosse
necessário se infectar. A terapêutica preventiva é sempre a melhor indicação.
Não esqueçamos, neste aspecto, a importância das relações familiares, da
intimidade, para que o adolescente possa expressar suas dúvidas e buscar
auxílio se necessário.
Se
os pais descobrirem que o filho é dependente químico, não devem fazer disto uma
tragédia, acusando-o, desesperando-se. Devem, sim, tratando o assunto com muita
seriedade, levar o jovem ao médico psiquiatra para iniciar o tratamento
necessário, ao qual pode ser acrescentada a terapêutica espírita (diálogo
amoroso, passes, água fluidificada).
Relações
Familiares
O
lar é escola de dignificação humana e a família jamais dará lugar ao egoísmo, de
modo que não irá desaparecer da sociedade terrestre.[14] Ao contrário do que parece nos
tempos atuais, a família não está em decadência. Está, como os velhos padrões
de uma forma geral, em processo de transformação.
O
próprio instinto gregário conduz o ser humano na busca por viver em grupo, e a convivência
entre filhos e pais é recurso psicoterapêutico valioso. Neste espaço,
trabalha-se e supera-se as exigências do ego, dando lugar aos interesses gerais
e superando reminiscências anteriores.
Da antiga família marcada pela
relação ditatorial entre pais e filhos, onde a mulher ocupava posição de objeto
e a responsabilidade sobre a prole não era dividida entre o casal, passamos por
um período de contestação que abre espaço para uma ética mais próxima da moral,
onde vêm alicerçando-se os valores do amor e da solidariedade[15].
Ser
filho é oportunidade de aprender a ser pai/mãe. Não sabendo exercer obediência
e submissão, dificilmente saberá orientar. Cabe aos pais graves
responsabilidades com relação aos filhos e a estes, da mesma forma, com os
pais, devendo aos últimos afeto e cuidados, independente de o merecerem ou não.
Devido às várias transformações
pelas quais passa o adolescente, não podemos deixar de considerar possíveis
manifestações de agressividade que, em propondo uma mudança de funcionamento no
grupo familiar como um todo, favorece o aparecimento de conflitos familiares. O
adolescente passa a agir em tentativa de controlar onipotentemente fora o que
sente que não dá conta internamente. A possível rigidez do adulto em apresentar
“proibições” variadas, quase sempre irracionais, responde pela curiosidade
atribuída àquilo que, por ser proibido, se infunde de características mágicas e
sedutoras. Por outro lado, a permissividade com relação a pequenos delitos
insculpe hábitos perniciosos que tendem a permanecer na vida adulta. Cabe a
orientação aos pais:
Se
ele agride, não revides com violência. Demonstra a utilidade das tuas forças
morais de tal modo, que no conflito em que ele se debate, nasça-lhe o desejo de
possuir a paz que tu desfrutas. (Marcelo Ribeiro)[16]
Os feixes nervosos, carregados de
energia e vitalidade, dão ao jovem a impressão de poder. A impulsividade pode
fazer arrastar-se ao prazer imediato, mas também pode ser disciplinada através
das tarefas dignificantes, evitando-se o ócio e o relaxamento demorado.[17]
O diálogo franco é fundamental,
dissolvendo de início os desentendimentos, antes que tomem proporções
significativas. Não há assunto que não possa ser abordado com amor, no lar, sem
expor as chagas alheias. Quando essa amizade não for encontrada em casa, o
adolescente buscará fora, muitas vezes em ambiente pouco saudável.
Recomenda-se,
por fim, a procura de tratamento psicológico nos casos em que se observe:
- isolamento excessivo (família,
amigos, escola);
- alterações constantes e
extremas no humor (entre euforia e depressão);
- agressividade excessiva;
- dificuldades escolares sem
motivos aparentes;
- dificuldades sexuais (com
relação a si mesmo ou na relação com outra pessoa).
Final
do Período
O final da adolescência tem como
característica crucial a aquisição das prerrogativas do adulto: independência,
contribuição criativa para a sociedade, desenvolvimento de um senso de
intimidade que pode conduzir o jovem a constituir nova família. Entretanto, o amadurecimento psicológico não
necessariamente acompanha as mudanças fisiológicas, de modo que podemos
observar diferenças entre crescimento intelectual e emocional.
Os
atavismos sociais e culturais relacionados à forma como se lida com a personalidade
em formação da criança e do adolescente, que podem se exprimir tais como
rigidez ou negligência, imprimem em seu psiquismo insegurança, temores,
desorganização[18]. Estes tenderão a se manifestar
na idade adulta através de comportamentos agressivos ou dependentes, dentre
outros, que escondem conflitos interiores diversos na busca por sentir-se
amado.
Para conquistar o amadurecimento
almejado, adentrando-se nas etapas seguintes da trajetória terrena, é
fundamental enfrentar com amor as dificuldades não superadas da infância, e
utilizando-se de informações novas, ir diluindo-lhe as fixações. [19] Reconhecer-se como o ser eterno
que é e não olvidar jamais as máximas “fazer a outrem o que gostaria para si
mesmo” como trilha segura ao conhecimento de si e do mundo, que permitirá a
definição dos rumos a serem traçados para execução na fase seguinte.
Referências
[1] Kaplan, H.,
Sadock, B. e Grebb, J. Compêndio de
Psiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. p. 61-66.
[2] Rizzi, C. B. e
Costa, A. O Período de Desenvolvimento
das Operações Formais na Perspectiva Piagetiana: aspectos mentais, sociais e
estrutura. In EDUCERE - Revista da Educação, p. 29-42, vol. 4, n.1,
jan./jun., 2004. (Acesso em nov. de 2011) Disponível em http://revistas.unipar.br/educere/article/viewFile/178/152.
[3] Bloise, Paulo. O Arquétipo do Heroi: Dependência e
Desenvolvimento. In Panorama Atual de Drogas e Dependências. Silveira, D. e
Moreira, F. org. São Paulo: Atheneu, 2006. (Acesso em novembro de 2011).
Disponível em: http://www.nucleoanthropos.com
[4] Franco,
Divaldo. Adolescência e Vida (pelo
Espírito Joanna de Ângelis). Salvador: LEAL, 2011. p. 11.
[5] Idem 4. p. 09.
[6] Franco,
Divaldo. Amor Imbatível Amor (pelo
Espírito Joanna de Ângelis). Salvador: LEAL, 1998. p. 18.
[7] Xavier,
Francisco Cândido. Missionários da Luz
(pelo Espírito André Luiz). 40ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. p. 21 a 29.
[8] Franco, Divaldo.
Laços de Família in Seminário
Formação de Equipes para Campanha “Viver em Família” (1994 – São Paulo).
Carvalho, A. (org.). 8ª ed. São Paulo: USE, 2002. p. 46.
[9] Franco,
Divaldo. Constelação Familiar (pelo
Espírito Joanna de Ângelis). Salvador: LEAL, 2009. p. 29.
[10] Idem 4. p.21
[11] Reformador. As Drogas e Suas Implicações Espirituais. [internet] Março de 1998. Aceso em
novembro de 2011.
[12] Franco,
Divaldo. Conflitos Existenciais (pelo
Espírito Joanna de Ângelis). Salvador: LEAL, 2005. p. 135-143.
[13] Idem 4. p.142
[14] Idem 9. p. 12.
[15] Idem 8. p. 30.
[16] Franco, Divaldo.
Terapêutica de Emergência (pelo
Espírito Marcelo Ribeiro). 5ª ed.
Salvador: LEAL, 2002. p. 209
[17] Idem 17. p. 207.
[18] Franco,
Divaldo. Autodescobrimento: uma busca
interior (pelo Espírito Joanna de Ângelis). Salvador: LEAL, 1995. p.
149-153.
Excelente!
ResponderExcluirBom dia, preciso de sua ajuda. Sou psicóloga e trabalhadora espírita. Preciso de algumas indicações. Podemos conversar?
ResponderExcluirExcelente!! Muito rico de informações!! Vc me autorizaria a multiplicar este texto no centro espirita que trabalho?
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